terça-feira, 18 de novembro de 2014

DILMA NA ENCRUZILHADA

POLITICANDO



     Depois da eleição acirrada, que ganhou por uma margem de três milhões de votos, num universo de 142 milhões, Dilma fez um belo discurso de vitória.
     Parecia que era a primeira vez que Dilma falava por si própria, libertando-se do papel de candidata do PT, agora que já tinha conquistado seu último  e derradeiro mandato. É claro que ela fez questão de render a homenagem devida a seu mentor, o ex-presidente Lula, demonstrando que não é pessoa de esquecer quem lhe deu a mão nos momentos mais difíceis.
     Mas na primeira entrevista após voltar ao trabalho, quando perguntada sobre uma declaração agressiva do Partido dos Trabalhadores a respeito das oposições, ela fez questão de dizer que não representava o partido, mas governava para todos os brasileiros.
     Para os bons observadores, parece evidente que o PT se tornou um problema a mais para a presidente Dilma. Aliás o Partido só criou problemas para ela durante a campanha e se não fosse o despertar da militância, quando perceberam que a vitória da direita era uma possibilidade real, provavelmente o barco teria naufragado, entregando o ouro da nação aos bandidos do PSDB e do DEM.
     Mas o fato é que Dilma não terá outra alternativa para se livrar do PT, sem parecer uma traidora, a não ser promovendo uma profunda reforma política, que desemboque na estruturação do novos partidos, dentre eles um novo partido de centro esquerda capaz de aglutinar o que há de mais ideológico na sua base, isolando os oportunistas que se escondem em legendas de aluguel ou no grande e disforme corpo do PMDB.
     E a única maneira de fazer isso é levando adiante um projeto que vai causar grande celeuma nas oposições:, o da Constituinte Revisora, Livre e Soberana. Foi ela, Dilma, quem lançou a proposta durante os protestos de 2013, como forma de fazer as reformas necessárias no país. É claro que a direita imediatamente chiou. Não querem mudanças para avançar, mas apenas para retroagir a um país dominado por uma elite podre.
     O próprio PT quer restringir a Constituinte à reforma política, impedindo que ele avance sobre outros privilégios das elites, com a reforma urbana, da educação, da saúde, dos monopólios da mídia e a reforma tributária, destruindo velhos privilégios que impedem o progresso do Brasil.
     Vai ser uma decisão difícil. Se ela se render ao corporativismo do PT e aliados, a reforma da Constituinte mais uma vez só vai contemplar os interesses dos poderosos, desembocando num gigantesco conchavo. Se ela avançar para a Constituinte Livre e Soberana, terá de enfrentar a batalha contra todos os interesses corporativos que se unirão contra ela, mas se libertará das amarras do PT e poderá angariar um grande apoio popular, levantando a juventude de 2013 a seu favor, em direção à construção de um novo país.
     Para quem já enfrentou tantos desafios como ela, isso não é impossível.

PAPO DE ARQUIBANCADA

(Ré) Começo

Dunga


         Meus amigos, o objetivo de Dunga em 2014 foi alcançado: a seleção brasileira ganhou todos os amistosos sob seu comando. Claro que não estamos levando em conta a qualidade dos adversários. O técnico da seleção, ao invés de testar jogadores - o fez apenas nos últimos amistosos, para poupar os atletas que jogam no Brasil - utilizou a base do time de Felipão para obter êxito neste começo de trabalho. A seleção brasileira jogou um futebol burocrático e não convenceu ninguém. Um meio campo pegador e um ataque dependente do brilho de Neymar, além de uma defesa formada por laterais poucos técnicos foi a marca do recomeço. A cartilha do novo comandante foi o que vimos de mais positivo: jogadores comportando-se como atletas e não como estrelas de comerciais. Caretas em "selfs" e choros gratuitos foram abolidos, graças a Deus ! Tomara que o Dunga seja mais ousado em 2015 e coloque a seleção com um pouco mais de qualidade no meio campo, embora não veja, atualmente, uma safra de jogadores muito criativa. Gostaria muito de ver o garoto Talisca, ex Bahia, atuando como volante, mas, pelo que vimos, o baiano não enche muito os olhos do comandante. #Ficaadica.





CLIPE DA SEMANA

O clipe desta semana é da canção QUEM ME LEVA OS MEUS FANTASMAS, com a interpretação magnífica de Maria Bethânia. Imperdível !

Maria Bethânia

APARTHEID URBANO


Apartheid urbano
As superquadras do Plano Piloto em meio a verdadeiros parques

Brasília foi criada no âmbito de um surto desenvolvimentista do país, nos anos 1950, e seguiu no seu projeto, aprovado em concurso internacional, as melhores especificações para o estabelecimento de uma nova maneira de viver, integrada à natureza e de acordo com a civilização do automóvel que se estabelecia sobre nosso planeta.
Embora não tenha até hoje sido completado, o projeto das superquadras, que deveriam se agrupar de oito em oito em Unidades de Vizinhança (nunca implantadas), com escolas fundamentais e infantis em cada uma delas, integradas à uma Escola Parque e à um clube em cada Unidade de Vizinhança, deveriam mesclar a modernidade e autonomia das unidades habitacionais, com a integração de seus moradores, promovendo o convívio harmônico através da educação e do lazer coletivo, e saudável, através do estímulo à prática de esportes.
Nada disso foi implantado, por temerem as elites da época que se tratasse de um projeto socialista, deixando os edifícios isolados nas superquadras, e dentro deles a solidão dos seus habitantes.
Mais grave ainda foi a implantação das chamadas cidades satélites do novo Distrito Federal, construídas para abrigar os pobres, quando o Plano Piloto, a parte projetada por Lúcio Costa, ainda estava no seu início, cheio de quadras vazias que podiam abrigar os trabalhadores.
Mas, uma vez mais as velhas elites entenderam que a cidade projetada para ser uma vitrine do novo Brasil que surgia, não devia ser enfeiada com a pobreza em que viviam os trabalhadores e que o melhor era escondê-los dos olhos do mundo em outras “cidades”, bem distantes do explendor arquitetônico das obras esculturais de Oscar Niemeyer.
Estas cidades passaram a ser chamadas cidades satélites, pois orbitavam em torno ao Plano Piloto (considerado até hoje como a verdadeira Brasília), como o sputnik, primeiro satélite artificial lançado ao espaço pelos russos em 1957, orbitava em volta da Terra.
Muitas surgiram desde então. As primeiras foram o Gama, assentamento criado a partir do projeto hexagonal de MM Roberto, que participou do concurso internacional para a escolha do Plano Piloto (vencido por Lúcio Costa), localizado na antiga fazenda do Gama, cuja sede ainda existe, preservada pelo patrimônio Histórico. 


O projeto de MMM Roberto para Brasília previa 7 hexágonos.
Um deles foi implantado para formar a cidade satélite do Gama
 
Na mesma época surgiu Taguatinga, na saída sul da cidade, Sobradinho, na saída norte, também construída na fazenda de mesmo nome, e Planaltina, antiga cidade colonial e sede de município que ficou dentro do quadrilátero do novo Distrito Federal. Parte do seu antigo território, porém, ficou fora do novo DF constituindo o município agora denominado Planaltina de Goiás.

Av. Comercial de Taguatinga em 1958

Av. Comercial de Taguatinga atualmente
Logo após a transferência oficial da Capital da Republica para Brasília, em 21 de abril de 1960, o projeto de um deputado federal transformou o antigo acampamento de obras denominado Cidade Livre, em mais uma cidade satélite. A antiga Cidade livre foi riscada no chão pelo engenheiro Bernardo Sayão, na época chefe da NOVACAP, a Companhia Construtora da Nova Capital, estatal criada para construir Brasília. Eram apenas três ruas onde qualquer um podia chegar e construir, sem nenhuma licença ou projeto, de forma a facilitar o assentamento de trabalhadores que chegavam (os “candangos”) e as empresas que quisessem prestar serviços no local. A ideia era que após a inauguração da capital tudo fosse removido mas, por pressão dos comerciantes estabelecidos no local, a Câmara Federal aprovou um projeto fixando definitivamente o assentamento com o nome de Núcleo Bandeirante.

 A Cidade Livre nos seus primórdios
Os barracos de madeira foram obrigados, então, a serem desmontados e reconstruídos dentro de lotes demarcados ao longo das três ruas, agora denominadas de Primeira Avenida, Segunda Avenida e Avenida Central, nomes que permanecem até hoje. Essa reconstrução dos barracos seguiu uma rígida tipologia imposta pela Novacap, com modelos de dois pavimentos, para as lojas comerciais e térreos para as residências, semelhantes aos utilizados na Avenida W3 sul, no Plano Piloto.
Os que não quiseram permanecer no local ganharam lotes na W3 Norte, que acabava de ser asfaltada, utilizando a mesma tipologia arquitetônica.
Em seguida, já durante o regime militar, foram criadas as cidades satélites do Guará, grande conjunto habitacional construído pelo recém-criado Banco Nacional de habitação, o BNH, situado às margens da estrada que liga o Plano Piloto à Taguatinga, e a Ceilândia, cidade criada pela CEI, Comissão de Erradicação de Invasões especificamente para erradicar a famosa Invasão do IAPI e sua vizinha, apelidada de Morro do Urubu, situadas em frente ao novo Núcleo Bandeirante.
Posteriormente nos três governos de Joaquim Roriz, já nas décadas de 1980 e 90, foram criadas as cidades de Samambaia, vizinha à Taguatinga e Ceilandia, formando um gigantesco núcleo habitacional, e Recanto das Emas, entre a BR-40, saída para Goiânia e o Gama. Na verdade o governador Roriz (nomeado por José Sarney quando ainda não havia eleições diretas para governador do DF) usou a possibilidade de dispor de terras públicas do DF para distribuir lotes a migrantes de regiões circunvizinhas que ele estimulava a virem para Brasília, formando imensos currais eleitorais que o ajudaram a se eleger mais duas vezes governador após a nova Constituição de 1988.
Depois disso várias outras cidades ainda foram criadas, como o Paranoá, a partir de uma invasão existente no local, resultante de um antigo acampamento de obras e “regularizada” pelo GDF através de um novo projeto urbanístico. Muitos outros antigos acampamentos de construtoras, da época da Construção da capital, permaneceram ocupados e foram posteriormente regularizadas, como a Vila Planalto, próxima ao Palácio do Planalto, a Metropolitana e a Candangolândia, ambas próximas ao Núcleo Bandeirante, a Vila Telebrasília, às margens do lago paranoá, e outras, todas seguindo traçados urbanos projetados pelo GDF.

Núcleo bandeirante hoje:
Prédios colados com iluminação/ventilação feita através de poços

Essa profusão de pequenos assentamentos urbanos, no entanto, tem em comum um Código de Obras muito diferente do código do Plano Piloto, permitindo que um compartimento de permanência prolongada, como uma sala de estar, por exemplo, possa se abrir para um poço de ventilação de apenas 80 x 80 cm, formando aglomerações extremamente insalubres.

 Cozinha abrindo para poço de ventilação
Não bastasse a expulsão dos trabalhadores e a venda das superquadras para as incorporadoras imobiliárias, elevando o preço do m2 do Plano Piloto a um dos mais altos do mundo, a permanência de códigos de obras diferenciados no mesmo espaço urbano, diferenciando mais ainda trabalhadores de funcionários de alta renda e parlamentares que habitam a cidade planejada por Lúcio Costa.
No Plano Piloto ergue-se uma cidade de padrões internacionais, enquanto nas satélites, o código de obras diferenciado permitiu o surgimento de verdadeiras casbahs, aqueles amontoados de construções, típicos dos centros históricos das cidades árabes, com ruelas estreitas e habitações insalubres, num verdadeiro apartheid urbano.
Embora as satélites venham recebendo novos e grandes empreendimentos imobiliários, com padrões muito melhores, não se justifica a permanência de padrões diferenciados dentro da mesma unidade federativa.

POESIA DA SEMANA




Estrela do mar


Um pequenino grão de areia
Era um eterno sonhador
Olhando o céu viu uma estrela
Imaginou coisas de amor

Passaram anos, muitos anos
Ela no céu e ele no mar
Dizem que nunca o pobrezinho
Pôde com ela encontrar

 Se houve ou se não houve
Alguma coisa entre eles dois
Ninguém pôde até hoje afirmar
O fato é que depois, muito depois
Apareceu a estrela do mar


Marino Pinto




RAPIDINHAS

Palhaços


     Aécio Neves se declarou "líder das oposições", sem perceber que o grande vencedor das eleições, dentro do PSDB, foi José Serra, eleito senador por São Paulo derrotando Eduardo Suplicy.
     Enquanto isso, seu ex-vice, Aloísio Nunes, continua fazendo besteiras, estimulando os grupos de ultra direita a fazerem manifestações pelo impechmeant de Dilma e a volta dos militares.
     Dois palhaços.
     Pra quem não sabe, Aloísio Nunes foi da esquerda armada e lutou contra a ditadura assaltando bancos. Da extrema esquerda passou para a extrema direita. Enquanto isso Aécio se dedicava à sua boa vida de playboy, nas idas e vindas ao Rio de janeiro.
     Nenhum dos dois tem consistência para liderar as oposições, que aliás já não representam muita coisa. Os milhões de votos que eles tiveram foram muito mais anti PT do que à favor dele mesmo.
     PT que aliás, continua fazendo besteiras. Se não fosse a firmeza de Dilma o país tinha caído na mão dos aventureiros.

O triunfo da impunidade


     Bastou Joaquim Barbosa se afastar do STF e Ricardo Lewandovsky assumir, para que os mensaleiros fossem todos soltos.
     Aqueles que lideraram uma intensa campanha contra nosso ministro negro, agora estão calados, satisfeitos. Tudo voltou a ser como dantes no quartel de Abrantes. Gente rica e poderosa não fica na cadeia e a impunidade triunfa mais uma vez.

Tragédia mexicana

     O anúncio de que um prefeito mexicano, ligado ao tráfico de drogas, mandou assassinar 43 estudantes que protestavam por mais verbas para a educação, deixou o governo do presidente Peña Nieto em situação pior do que já estava.
     Nieto, um liberal ao estilo Aécio Neves, quebrou o monopólio do Petróleo no México (como FHC fez no Brasil) e partiu para a privatização, entregando o país à sanha do capital estrangeiro. Ele é o queridinho da revista The Economist, mas é cada vez mais odiado pelos mexicanos.
     Definitivamente o neoliberalismo naufraga no mundo inteiro. A Europa em crise prolongada é seu melhor exemplo, mas o FMI, atrelado aos interesses da banca internacional, insiste nas medidas de "ajuste fiscal", que provocam recessão, desemprego em massa e cortes nos programas sociais, jogando povos, antes ricos, na mais profunda miséria.

Dilma e a Petrobrás


      O escândalo na Petrobras é a grande chance para a presidente Dilma se afastar do PT e se colocar acima dos partidos. Claro que ela não pode romper completamente, pois deve muito à Lula, mas pode dar início ao processo de consulta popular sobre a reforma política, que deve desembocar numa grande reforma partidária. É a chance dela montar um novo partido com o que houver de melhor na base aliada, sem parecer ingrata.
     Aliás, se Dilma quiser dar uma virada histórica, recuperando a sua popularidade, basta passar o rodo nos corruptos, de todos os partidos, e decretar uma intervenção na CBF. 
     Popularidade 90% no dia seguinte.

RISOS

Piada contada: sogras

Ary Toledo




quinta-feira, 30 de outubro de 2014

POLITICANDO

Grandes batalhas virão


     Acabou-se o tempo dos consensos, inaugurados em 2002 com o Lulinha Paz e Amor, que queria agradar a todo mundo.
     Quem lida com gente sabe que conciliação é uma estratégia limitada  e passar a mão na cabeça, tentando levar as coisas na base da simpatia, pode dar certo por algum tempo mas as contradições ocultas um dia surgem e tem de ser enfrentadas.
     Este parece ser o tempo que vai começando no Brasil. Por algum tempo a direita ficou adormecida, esperançosa de que os governos de Lula e Dilma fracassassem permitindo que eles voltassem ao poder para restabelecer os privilégios das velhas oligarquias, com 500 anos de domínio absoluto. Mas a dificuldade que enfrentaram nessa eleição, apesar de todas as baixarias que usaram, com destaque para a revista Veja, líder absoluta do jornalismo mais sujo e desonesto da história, fizeram acender a luz vermelha no QG do grande capital.
     Do lado da esquerda, porém, parece que nem todos aprenderam a lição. Lula já está falando em voltar à presidência em 2018, como se o país de hoje (ou de amanhã) fosse o mesmo da virada do século. Não é. Mudamos e avançamos muito em alguns aspectos e em outros estamos parados, à espera do surgimento de lideranças capazes de lidar com as situações novas. 
     O fato é que ninguém aguenta mais essa política que aí está. Nem o PT, nem o PSDB, muito menos o DEM, representam mais nada além de seus próprios interesses. O velho PMDB há muito tempo deixou de ser um partido e virou um aglomerado de grupos de interesses, os mais diversos, que se mantém pela sua postura de ficar em cima do muro e sempre no governo, não importa se eles mudam.


     Talvez por isto Dilma tenha conseguido se reeleger, por ela não representar propriamente o PT, já que seu governo tem um perfil mais tecnocrático e que, apesar de tudo, vem conseguindo conquistas importantes.
     Agora que as diferenças estão expostas chegou a hora de enfrentá-las e decidir que rumo o país vai tomar. Se vai voltar ao comando das oligarquias e do capital internacional ou avançar em direção a uma sociedade nova, uma espécie de socialismo do século XXI que, com certeza, não será aquele anunciado por Hugo Chavez misturando populismo com incompetência gerencial. O Brasil é melhor do que isso.
     O novo deve ser o aprofundamento da democracia, com participação cada vez maior de população que não se contenta mais em delegar poderes de 4 em 4 anos, mas quer participar o tempo todo. Deve ser também uma economia que dê espaço aos pequenos empreendedores e mantenha o Estado como fiador do bem estar geral, através dos serviços públicos, rompendo com os gargalos que impedem a educação, a saúde e os transportes de funcionar bem, o que significa enfrentar interesses corporativos e empresariais poderosos.
     A educação deve ser a base da inovação tecnológica e, para isso, precisa passar por uma verdadeira revolução tirando-a do controle de empresas particulares, Estados e Municípios e colocando-a sob controle direto do governo federal, embora abrindo sua gestão para as próprias comunidades, através de conselhos escolares unificados, que elejam suas prioridades, seus diretores e definam seu currículo, seguindo os parâmetros nacionais definidos pelo MEC.


     Descentralizar não é municipalizar. São coisas diferentes. Hoje a educação básica está entregue à incompetência municipal, que centraliza sua gestão colocando-a à serviço das forças mais atrasadas da nação, os grandes proprietários de terra do interior que nunca quiseram educar o povo.
     A saúde também precisa ser federalizada, acabando com essa utopia falida que é o SUS, que ignora a realidade do sistema político nacional e acredita que os conselhos de saúde farão uma gestão independente do sistema, como se a política não influenciasse esses conselhos, controlados também pelos prefeitos que negociam entre si os serviços que geram mais renda aos municípios.
     Essa utopia de conselhos populares está pra lá de falida em todos os aspectos. Precisamos de gestão federal e descentralização nas unidades de saúde e educação, passando ao largo da política municipal. 


     Quanto ao sistema eleitoral e partidário, as soluções estão postas sobre a mesa há décadas, mas os interesses corporativos do Congresso Nacional impedem que a reforma seja feita. São eles; o voto distrital, o fim das coligações e a eleição dos mais votados individualmente, permitindo que pequenos setores isolados da população sejam representados. É preciso também facilitar o processo de derrubada de representantes populares que não estejam exercendo bem os seus cargos, sejam eles legislativos ou executivos.
     Por isso precisamos de uma Constituinte exclusiva, eleita com a finalidade única e provisória de reformar a Constituição de 1988, feita por deputados e senadores, que impediram a derrubada de seus próprios privilégios.
     É claro que a direita e os atuais partidos não querem nem ouvir falar nisso, pois não terão garantia de controle sobre seus resultados. Preferem eles mesmos fazer os remendos na Constituição e chamar o povo apenas para dizer sim ou não em um referendo.
     Os próprios partidos da coligação governista querem limitar a Constituinte à reforma política, deixando intocados os interesses que impedem uma reforma na educação, na saúde, nos transportes e também uma reforma urbana. 


     Mas de nada adiantará entregar essas reformas ao Congresso, que tenderá a reconstruir os velhos conchavos para garantir privilégios. É preciso passar ao largo deles e deixar a verdadeira fonte do poder democrático, o povo, falar por si.
     Como a ideia da Constituinte exclusiva e soberana partiu da presidente Dilma (sendo logo rechaçada pela classe política e pelos juristas à seu serviço), há uma esperança que ela assuma essa batalha, mesmo contra as lideranças do seu atual partido. 


     No campo internacional o Brasil vem seguindo um rumo novo que precisa ser aprofundado, fortalecendo sua relação com a América Latina e com as grandes nações emergentes do mundo, Rússia, China, Índia e África do Sul, através dos BRICS. Com isso nos afastamos do velho e decadente domínio das nações imperialistas, Estados Unidos, Europa e Japão, cuja hegemonia vem decaindo rapidamente, abrindo uma estrada segura para o futuro.
     Nada disso virá sem muita luta. Essa guerra já foi deflagrada pela direita, falta apenas a esquerda entender que, se não mudar, perecerá já na próxima eleição.
    
     
    

PAPO DE ARQUIBANCADA

José Trajano


preconceito disseminado nas eleições e recebem meus parabéns pela postura

       Após as manifestações preconceituosas de alguns jornalistas e atletas em relação ao nordeste do país e ao resultado das eleições, Hulk, jogador do Zenit, e Ana Moser, ex-jogadora de vôlei, se manifestaram em suas redes sociais rebatendo tais declarações. Por essa atitude, eles recebem meus parabéns.




CLIPE DA SEMANA

O clipe desta semana é da canção POIS É, PRA QUE ?, composta e interpretada por Sidney Miller. Curtam ! 


Sidney Miller



DESTAQUE

Nada como viajar

     Pois é, dizem que as viagens ilustram e neste aspecto não posso me queixar dessa vida, pois tenho viajado muito. Aliás, não me queixo da vida em nenhum outro aspecto, pois me considero um homem afortunado, pelos filhos e filhas, netas e neto que a vida me deu. Gozo de boa saúde e na idade em que estou continuo ativo e produtivo e, ainda por cima, reencontrei o amor.
     Mas numa dessas viagens fui parar num lugar realmente especial; a cidade de Faz de Contas.
     Interessante esta cidade onde tudo parece ser o que não é.
     Soube pelos antigos moradores, que durante muitos anos o município foi governado por um velho caudilho, conhecido como Coronel Pedra. Ele mandava em tudo, bem autoritariamente, mas a seu jeito cuidava da cidade e das pessoas, embora não perdoasse os inimigos.
     Como todo ditador (embora seu reino fosse minúsculo), vivia rodeado de puxa-sacos, que faziam de conta que o amavam e idolatravam (salve, salve), embora à boca pequena odiassem ter de submeter-se à autoridade do velho.
     Dentre eles havia um que sobressaía. Na verdade não era um homem, mas um cão, que vivia aos seus pés, lambendo-os, tentando agradá-lo de todas as maneiras em troca de migalhas, que o Coronel Pedra lhe atirava quando lhe convinha.
     Quando precisava que o animal demonstrasse sua fidelidade canina, o Coronel Pedra fazia de conta que o amava, lhe fazendo festas e permitindo que ele também fizesse algumas festas, mas mantendo-o sempre firme na sua coleira, submisso a seus pés.
     Assim muitos anos se passaram, com a cidade dominada pelo caudilho e um misto de amor e ódio ligando-o aos habitantes, que apesar de tudo viviam razoavelmente bem, desde que se rendessem ao seu domínio.
     Como um bom coronel das antigas, Pedra era um homem conservador, ligado aos herdeiros da ditadura militar que governaram a Bahia por décadas, sempre acompanhado por seu cão lambe-botas, que ao farejar qualquer oposicionista logo começava a latir, denunciando-o, para que seu dono se apressasse a incluí-lo na sua lista de perseguidos políticos.
     Muitos anos se passaram, sempre do mesmo jeito. A cidade que era tombada pelo Patrimônio Histórico, fingia ser conservada, pois uma outra ajudante do coronel controlava o escritório local do IPHAN, mesmo que não tivesse nenhum conhecimento técnico, espantando os poucos arquitetos que se aventuravam a trabalhar naquelas lonjuras, e permitindo que seus amigos e os do Coronel, demolissem todas as construções antigas, mantendo apenas as fachadas.
     Claro que os adversários do Coronel eram obrigados a seguir rigidamente as normas do patrimônio, sendo estritamente vigiados e fiscalizados, dentro do melhor espírito burocrático.


     A cidade também fingia ser um paraíso ecológico, encravada que era no meio de lindas montanhas, embora a prefeitura escondesse um imenso lixão à céu aberto em local distante dos olhos dos turistas e estimulasse por meio de sua Secretaria de Agricultura, o uso de agrotóxicos nas plantações dos pobres lavradores que viviam de suas lavouras, afinal os fabricantes desses venenos pagavam muito bem pela cumplicidade dos funcionários públicos.
     Assim tudo parecia no melhor dos mundos aos olhos dos visitantes, enquanto uma pequena elite, que se intitulava "O grupo", dominava os parcos recursos da prefeitura, sempre em proveito próprio, espantando qualquer aventureiro que ousasse protestar, sob o argumento de que eles eram de fora e não podiam se manifestar.
     Democracia e direito de ir e vir eram conceitos muito distantes daquela comunidade, que vivia mergulhada no atraso e na submissão, fazendo de conta que era feliz.
     Na cidade havia também muitos gays, mas todos casados com pessoas do sexo oposto, fazendo de conta que eram héteros, afinal era preciso preservar as aparências da moral e dos bons costumes.
     Mas como tudo muda neste mundo, chegou um tempo em que um desafiante conseguiu vencer o velho Coronel nas eleições. Era um jovem taciturno, cujas ideias ninguém conhecia direito, e que tendo experimentado o gosto ruim de ser oposição num Estado dominado por coronéis, conseguiu dividir o velho "grupo" local e vencer Pedra.
     De início muita gente se encheu de esperança, achando que o jovem seria o início de uma verdadeira mudança, mas logo perceberam que tudo não passava de novo faz de contas, na medida em que o velho cão que vivia preso aos pés do antigo coronel se passou para o lado do novo Prefeito, tornando-se muito mais agressivo, pois este, ao contrário de Pedra, não o mantinha na coleira, mas soltou-o para que ele acuasse e perseguisse qualquer um que ousasse desafiar a nova liderança.


     O novo prefeito era o Dr. Patifarias que, apesar de jovem, logo assumiu as rédeas do poder com os mesmos métodos do antigo coronel, com a diferença de que, não tendo talento para dialogar com o povo e negociar benefícios em troca de apoio, passou à perseguição pura e simples de todos que não aceitassem seu domínio, desviando todos os recursos da prefeitura para si e para o seu reduzido grupo, que logo passou a debochar do povo.
     Então os membros do "grupo" passaram a circular todos em reluzentes automóveis zero km, cujas prestações eram pagas pela prefeitura como se fossem aluguéis de veículos, que ficavam à disposição dos próprios donos, numa manobra que nunca era investigada pela justiça, pois Dr. Patifarias e seu cachorro solto, tinham muitos amigos por lá, que faziam de conta que tudo era normal.
     Logo Dr. Patifarias tratou de fazer seu pé de meia, comprando restaurantes em São Paulo, enquanto não apenas pagava a fidelidade de seu cão com festas, mas permitia que ele também fizesse suas festas, para alegria de todo o grupo.
     Assim, até hoje ainda Dr. Patifarias e seu cachorro solto dominam a pequena cidade de Faz de Contas. Enquanto o jovem prefeito vive viajando e nada fez até hoje pela sua terra, seu cachorro solto cuida de que as coisas se mantenham no lugar, farejando tudo, vigiando a todos e mostrando os dentes ao primeiro sinal de rebeldia.
     Ultimamente até resolveram se bandear para os lados do partido que representa os trabalhadores, fazendo de conta que são de esquerda para se aproximarem dos novos governantes do Estado e garantir seu apoio nas próximas eleições, afinal a velha política do Coronel Pedra está morta e enterrada.
     E assim a vida segue nesse estranho lugar, onde tudo parece ser o que não é. Mas como as viagens ilustram, pessoas viajadas como eu conseguem enxergar além das aparências mal disfarçadas e ver que por trás do faz de contas existe muita coisa errada.

POESIA DA SEMANA


Arthur Rimbaud




Canção da Torre Mais Alta

Ociosa juventude
De tudo pervertida
Por minha virtude
Eu perdi a vida.
Ah! Que venha a hora
Que as almas enamoram.

Eu disse a mim: cessa,
Que eu não te veja:
Nenhuma promessa
De rara beleza.
E vá sem martírio
Ao doce exílio.

Foi tão longa a espera
Que eu não olvido.
O terror, fera,
Aos céus dedico.
E uma sede estranha
Corrói-me as entranhas.

Assim os Prados
Vastos, floridos
De mirra e nardo
Vão esquecidos
Na viagem tosca
De cem feias moscas.

Ah! A viuvagem
Sem quem as ame
Só têm a imagem
Da Notre-Dame!
Será a prece pia
À Virgem Maria?

Ociosa juventude
De tudo pervertida
Por minha virtude
Eu perdi a vida.
Ah! Que venha a hora
Que as almas enamora!





      Jean-Nicolas Arthur Rimbaud foi um poeta francês. Produziu suas obras mais famosas quando ainda era adolescente sendo descrito por Paul James, à época, como "um jovem Shakespeare". Aos 20 anos já havia escrito 20 livros de poesia.